As classes dominantes, estribadas num saber refinado
ao longo de séculos, preparam-se para nos fazer pagar os seus desvarios e
ociosidades com um exacerbado IMI.
Os
capatazes desta pátria de negreiros seguem à risca os ditames dos seus
antecessores. Daqueles que na Inglaterra encerravam nas Casas dos Pobres os
desnudados de terras e de posses, forçados a trabalhar dia e noite com um único
móbil, o enriquecimento dos patrões. Ou dos seus sucessores em plena ditadura
salazarenta, que açulavam a polícia a perseguir os habitantes da serra da Estrela,
operadores de teares manuais em suas casas, atormentando-os com a extorsão, o
roubo e a prisão para eliminar a concorrência e obter mão-de-obra dócil e a
baixo custo para a indústria têxtil.
Foi
gente de semelhante estirpe que, nas colónias africanas, maquinou o imposto de
palhota, destinado a acorrentar a população. Sobre a habitação tradicional,
construída pelos próprios na sua terra, passou a incidir um imposto, para que
lhes fosse consentido habitá-la! As autoridades, raivosas face à autonomia das
populações, assente na economia de subsistência que o uso ancestral das férteis
terras comunitárias lhes permitia, decidiram inverter a situação. Para isso fizeram
uso de um hábito tão velho quanto o Estado, a imposição do imposto. E
semelhante rapina teria fatalmente de ser satisfeita em dinheiro. Na ausência
do vil metal só restava àquelas esbulhadas gentes uma saída, o trabalho nas
plantações coloniais, a venda da força de trabalho a baixo custo, para
conseguirem o dinheirame infligido pela canga fiscal.
Estavam
criadas as novas vítimas da sociedade mercantil, subitamente envolvidas na
espiral da necessidade de algo que até ali desconheciam, o dinheiro e a
sociedade da mercadoria que o impõe. Tratou-se, de facto, de um importante
passo naquilo que a desvergonha reinante classifica como um acto civilizador.
Acresce que essa intriga foi montada na ausência da escravatura, (falsamente)
extinta no início do século XIX: o salariato, a escravatura moderna, envolvia toda
a humanidade.
Nos
dias de hoje somos acossados pelos mandarins hodiernos cada dia com mais
impostos, chupistas do fruto do nosso trabalho, quando o alcançamos: não
satisfeitos com o saque generalizado sobre as carteiras do forçado
contribuinte, os sobas em exercício resolveram recriar o imposto de palhota. Sem
a imposição do trabalho assalariado, face à sua raridade, mas com as mesmas
perversidades. Ou seja, o temor do amo, que flagela os seus servos com a imolação
da precariedade e do desemprego, o pavor do cobrador de impostos, ou a
concorrência entre desgraçados e a obediência suportada pelo medo.
A última trapaça dos novos caudilhos é o abrutado
aumento do imposto sobre a habitação, o IMI. Num país onde a política
habitacional, favorável à especulação imobiliária e à ganância bancária, impede
a criação de habitação para aluguer, quase todos são proprietárias, embora
apenas da casa onde residem. Todos estes proprietários, com dificuldades
crescentes para o pagamento da prestação mensal ao banco, cada dia maior face
aos salários aceleradamente reduzidos, deparam hoje com um novo pagamento, o
actualizado IMI, que os “nossos queridos líderes” decidiram aumentar para meio
por cento do valor matricial da habitação.
E isto representa muitas centenas de euros, nada
menos que 500 euros anuais por cada 100.000 euros do valor do registo da
habitação. Imagine-se uma casa adquirida por 150.000 euros: pois, agora, os
seus “proprietários” terão de pagar um imposto anual de nada menos que 750 euros
– embora, devido à queda do preço especulativo do imobiliário, seja actualmente
atribuído ao apartamento um valor de cerca de 90.000 euros. Estamos, ou não, em
presença de um novo imposto de palhota, que nos obriga a cortar em despesas
indispensáveis para podermos pagar aos bancos e ao estado?
Talvez a grosseria do 1º ministro faça assim algum
sentido e deva ser levada à prática. Não disse ele que “o desemprego é uma
magnífica oportunidade para o desempregado”? Aceite a premissa, é preciso
levá-la até às últimas consequências. Num mundo em que o trabalho assalariado escasseia,
talvez seja chegada a altura de lhe por fim. Ao trabalho, que raramente coincide
com a actividade que cada um gostaria de exercer, e à opressão que lhe dá origem.
E imponha-se ao Dr. Coelho a sua receita. Que
abandone o cargo, mergulhe no desemprego, descubra esse mundo de oportunidades
de que fala e deixe-nos em paz. E não se esqueça de levar consigo todos os seus
parceiros das mais variadas colorações partidárias, que nos exploram e oprimem,
com o IMI, a crise e demais invencionices com que estrangulam as pessoas para
que os bancos e os seus apêndices lucrem e sobrevivam.
Mas desta vez não vá bater à porta dos amigos
capitalistas para o mimarem, como fez após terminar a licenciatura aos 30 e
muitos anos (até aí sem registar qualquer actividade profissional…) quando, num
assombroso reconhecimento dos seus méritos, foi nomeado administrador de 4 empresas.
Assim não vale, Dr. Coelho!
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